sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Cavalos

Difícil não gostar de cavalos.

Pra quem conviveu com eles, os escovou ou pintou, e pra quem só os viu. Como não gostar dos olhos enormes, da crina, dos músculos? da cauda caudalosa de fios que sacode no passo? Até na nuca das moças gostamos de rabo de cavalo.

Como não gostar do trote e do galope do baio, do alasão ou do pampa engraçado? quem não vai gostar de cavalos? quem, criança, se não teve, pelo menos não imaginou ter um, até no apartamento? quem não imitou com a língua e o palato o cla-clô cla-clô cla-clô, aqui mal escrito, dos passos de alternância complexa de patas duras?

O bicho do carrocel nem precisava de mais motivo pra ser amado, mas foi escolhido pra tarefa moderna, celestial, da equoterapia. E aquele que pouco tem de corpo sente o resfolegar e o tum-tum do coração do gigante sob si.

Difícil não gostar de cavalos.

Mas por que diabos a polícia tem cavalos?

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terça-feira, 26 de novembro de 2013

Fábula cruel

Houve um artista muito famoso. De obras difíceis até de olhar, inspiradas na crueldade humana. Naquele tempo a arte já incluía o completamente feio.

O famosíssimo artista era fumante compulsivo e tinha um único filho. Nos intervalos da sua arte, tinha o hábito de apagar os cigarros nos pés do menino. O cinzeiro.

O fumante morreu e sua arte permaneceu como das mais importantes da sua época. Tornou-se “pessoa cuja trajetória pessoal, artística ou profissional tenha dimensão pública” (*).

O cinzeiro não teve vida fácil. Os traumas o acompanharam por décadas. Nunca os esqueceu, mas, à custa de muita análise e muito divórcio, botou sua dor em um baú no sótão. Por conta das cicatrizes, não ia à praia e só amava no escuro, mas ia vivendo.

Até que um dia, publicaram sua antiga condição de cinzeiro do pai. Foi uma “divulgação de imagens, escritos e informações com finalidade biográfica” (**). Em um programa de televisão.

À alegação de que o “apagar de cigarros em pezinhos infantis” não tinha finalidade biográfica, respondeu o advogado: “mas é parte indissociável da arte do fumante”.

Alegou-se também que não se tratava de biografia, mas de programa de televisão.  “Se a lei não restringe, não cabe ao intérprete restringir”, rebateu o estudioso e combativo causídico.

Tudo voltou. Tiraram o baú do sótão e não mais bastavam os sapatos e o escuro. De novo o cinzeiro não podia olhar ninguém nos olhos.

Repleto de bitucas, ganhou uma grande indenização por danos morais e pôs formicida Tatu na taça do vinho mais caro que encontrou.

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(*) e (**) – critérios da proposta de alteração do artigo (clique)  de lei de proteção à divulgação de intimidades

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terça-feira, 12 de novembro de 2013

Sempre outra

Esse cara é assim: todo dia a gente descobre a canção mais bonita que ele já fez.

Sublime.

(até pensei - clique)
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